Do ato de entrelinhar 4 - Drummondiamando

"Amor é privilégio de madurosEstendidos na mais estreita cama,Que se torna a mais larga e mais relvosa,Roçando, em cada poro, o céu do corpo."*

Amor é privilégio dos que se desagarram dos textos, da matemática de encontrar em linhas retas, essas mesmas que nos separam de seus encontros. Porque amor vem da arte de despir-se dos medos, e despidos os medos despem-se os personagens. Aonde termina o poro de um e começa o corpo do outro, que completos em si não rejeitam a estreiteza do encontro, e encontrando se rarefecem  como céu na manhã.

"É isto, amor: o ganho não previsto,O prêmio subterrâneo e coruscante,Leitura de relâmpago cifrado,Que, decifrado, nada mais existe"*

Amor o é dentro do tudo que não mais se espera, perdoado em si o tudo que se esperou, depois, tanto depois, de despertencer quem se foi em busca, novelo desenrolado dos novelos alheios, e existir fora da novela empurrada dos desenganos, para aventurar-se no vazio que se preenche amando.

"Valendo a pena e o preço do terrestre,Salvo o minuto de ouro no relógioMinúsculo, vibrando no crepúsculo."*

Único em si como a fusão das partes, manifestação maior do que se alcança, presença inesgotável de um no outro. Raro, custoso, desapegado. Não predestinado pela liberdade das escolhas. Não mapeável por suas sutilezas. Mas mágico, tão mágico se conquistado.

"Amor é o que se aprende no limite,Depois de se arquivar toda a ciênciaHerdada, ouvida. amor começa tarde."*

Amor é para os de coragem.

*Carlos Drummond de Andrade, AMOR E SEU TEMPO

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